quarta-feira, 11 de novembro de 2009

Destino

Quem já levou um pé sabe como ela estava se sentindo naqueles dias. A história se arrastava há tempos. O moço dava constantes sinais de desgaste, mas ela, tão devotada àquela maluquisse, tentava não ver. Aquele amor já começará todo errado, todo do avesso, mas era bom e ganhava sempre muitos sorrisos à sua moda. Acabou de um jeito que não supunham, mas como diz o Paulinho da Viola “A solidão é o início de tudo”.

Na primeira madrugada não conseguiu pensar como a sábia frase, passou em claro, chorou, escreveu, releu todas as coisas que já tinha dito, escreveu outras tantas, o difícil foi se amainando. Sofrimento, caro amigo, é feito pra sofrer até se esgotar. Foi o que ela fez. Quando acordou não tinha vontade de nada, obrigou-se, pois sabia que não valeria mais um dia inerte. Colocou o que ainda restava de dor na gaveta e assim se foi.

Lugar improvável para uma cidade que oferecia milhares de passeios interessantes. Preferiu a companhia dos seus. Dirigiu sem pensar em nada. Olhou o dia lindo de sol, pensou que a filha gostaria da aventura. Mudaram os planos, escolheram um lugar que não era a primeira opção. Sentaram sem se preocupar com a estética. Falaram amenidades. Furtivamente ela fugiu em alguns momentos. Caminhou com seus pensamentos. Ouviu galanteios que não lhe despertaram. Foi simpática, conversou, sorriu, mas estava ausente.

Quando o sol baixou, os caçulas já se conheciam e se divertiam. Ela sorria de longe vendo a tarde cair. Chamaram-na à mesa, mas não a convidaram a sentar. Ela, na sua segurança de quem nada quer, se convidou. Ele tinha ares distantes. No começo pensou ser levemente arrogante, mas depois foi notando os detalhes. A conversa desenrolando. As histórias os fazendo rir. Os fios do destino que iam tramando beleza. O sorriso já inebriava. Os silêncios demonstravam timidez. Os olhos, uma certa melancolia. Ela não mais lembrava do triste. A atmosfera já se fizera cúmplice. Sem perguntas ele a tomou como sua, seus olhos já a haviam denunciado. Também sem perguntas ele a levou para sentir a brisa, o mar, a lua, as estrelas. O desejo abraçou a noite.

Depois de tempos, voltaram a terra. Cada um para o seu lado. Telefones e possíveis encontros. Ela voltou feliz, seu coração lhe dizia que naquela noite ela havia ganhado um presente.


Futuros Amantes, Chico Buarque.
03/11/09

quarta-feira, 4 de novembro de 2009

Mamulengos

Coçava os joelhos levemente e suspirava. Suspirava aqueles suspiros profundos dos velhos negros. Ele era grande, sólido e altivo, mas suas mãos, apesar de fortes, eram solitárias. Talvez pedissem solicitude, mas eram orgulhosas e pensativas demais para isso.

As mãos e os joelhos conversavam naquela manhã. Foi possível ouvir um sussurro: “Desejaria-te toda a bossa de uma vida”. As mãos sorriram amavelmente para os joelhos.
15/10/09


Magamalabares, Marisa Monte e Carlinhos Brown.